O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Alerj, deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), assumiu nesta manhã o compromisso de não deixar silenciar na impunidade os casos de crianças mortas em favelas durante incursões policiais. Das 10h às 13h, durante audiência pública nesta terça-feira (2/6) na Assembleia, os pais das vítimas — pelo menos cinco desde o ano passado — ficaram cara-a-cara com as autoridades das polícias Civil e Militar responsáveis pela investigação dos crimes. “Estamos falando de vidas. A Comissão vai acompanhar atentamente cada um desses casos e vamos encaminhar as famílias ao Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública e do Ministério Público para que sejam tomadas todas as providências necessárias”, afirmou Freixo.
Parentes e vizinhos das vítimas lotaram a sala da audiência (316), que foi aberta com a exibição de um documentário de oito minutos sobre a morte do menino Matheus, em dezembro do ano passado, no Complexo da Maré, onde também morreu Renan, de três anos, baleado em outubro de 2006. Entre os participantes da audiência, o comandante do 22º BPM (Maré), coronel Rogério Seixas da Cruz, confirmou que, no caso de Matheus, PMs foram afastados das ruas e vão responder por transgressão disciplinar, porque a morte ocorreu quando entraram na favela sem autorização superior.
Além do comandante do 22º BPM, participaram da audiência o comandante do 14º BPM (Bangu), coronel Pedro Paulo da Silva; as delegadas Márcia Julião, da 34ª DP (Bangu), e Valéria de Castro, da 21ª DP (Bonsucesso); e o delegado José Augusto Pereira, corregedor geral da Polícia Civil. O corregedor geral da PM, coronel Mauro Assad Couto, havia confirmado presença, mas faltou à audiência. As autoridades presentes prometeram fornecer à Comissão informações sobre o andamento das investigações e também ouvir as famílias.
O relato dos pais de duas das criou comoção no público e entre participantes da audiência. “Júlia saiu de casa para comprar refrigerante a 100 metros de casa e quando voltou estava ferida na barriga. Pensamos que tivesse sido uma pedra. Mas era uma bala e ela morreu no hospital. Todo dia eu choro pela perda da minha filhinha linda. Não estou dizendo para o Estado não agir na favela. Mas tem que agir para a nossa segurança. Minha filha tinha oito anos. Isso acabou com a minha vida. Isso não pode mais acontecer”, desabafou o pai da menina, Wagner Alves de Carvalho.
“Meu filho tinha voltado da escola, porque não teria aula, e morreu em frente de casa com uma moedinha de R$ 1 na mão. Ainda vi um policial que saiu correndo. Minha vida acabou e só tenho força para continuar porque tenho mais sete filhos para criar. Os irmãos perguntam pelo Matheus e digo que ele está no céu. Agora vivo com medo de pôr as crianças na rua para ir para a escola. Quando isso vai acabar?”, desabafou, também, a mãe de Mateus, Gracilene Rodrigues dos Santos, de 34 anos.
“Quem sabe esse mal estar na sala nos faz (as autoridades) trabalhar melhor?”, disse Freixo, após o relato dos pais, diante dos delegados e comandantes de batalhões das áreas onde os casos ocorreram.
Participaram da audiência representantes das ONGs Justiça Global; Projeto Legal; Ceasm; Uerê; Rede de Comunidades contra a Violência; Observatório de Favelas; DDH e Redes, além da Comissão de Direitos Humanos da OAB. Representantes das entidades relataram as dificuldades encontradas no acompanhamento das investigações. “Fomos nove vezes à delegacia e não conseguimos ter acesso ao inquérito policial”, acusou Antonio Pedro Soares, do Projeto Legal, que monitora o caso de Mateus, de oito anos, morto em dezembro do ano passado, com um tiro de fuzil, no Complexo da Maré.
“Em casos como o de Felipe, de 17 anos, a situação se torna ainda difícil, porque depois dos 15 anos, o jovem já é tachado como criminoso”, alertou Gustavo Mehl, da Justiça Global, entidade que anunciou o encaminha mento hoje para a ONU do relato sobre a morte do estudante, também no Complexo da Maré, em abril deste ano. O caso foi registrado como auto de resistência, embora a família e a comunidade afirmem que houve uma execução.
“Que Diabo de polícia é essa? Ocorre um genocídio nessa cidade. Quem protege quem?”, desabafou Ivonne Bezerra de Melo, do projeto social Uerê, mantido pela artista plástica na Maré. Ela denunciou as circunstâncias suspeitas em que ocorreu, por exemplo, a morte de Matheus, em incursão policial sem autorização do batalhão: “Policiais entram na favela para receber a semanada (propina paga por traficantes)”.
Só na Vila Aliança, na Zona Oeste, há notícia de três crianças mortas em um período de menos de 30 dias, entre março e abril, segundo Margarida Pressburger, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ. “Os casos se repetem. Casos novos surgem todos os dias. Estamos cansados”, disse Margarida, referindo-se aos casos de Yasmin, de três anos, de Júlia, de oito anos, e de um bebê de oito meses. “A bala nunca é de ninguém”, lamentou a representante da OAB, ao lembrar que há dificuldade de se comprovar a autoria dos crimes em exames de balística, pelo uso de armas nem sempre oficiais por policiais.
“As pessoas estão morrendo em um contexto em que prevalece a lógica da guerra na segurança pública. É preciso apurar a responsabilidade por essas mortes”, afirmou o presidente da Comissão de Direitos Humanos.
Por Assessoria de Comunicação - Mandato Marcelo Freixo (PSOL)
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